As categorias ontológicas da Metafísica

Uma das principais fontes da perplexidade gerada pela pergunta "o que é o ser?" está na absoluta falta de direções óbvias que orientem uma resposta. Uma alternativa é investigar a constituição material e as leis fundamentais da natureza. Essa foi a trilha inaugurada pelos pré-socráticos e hoje seguida pelas ciências naturais. Mas, se as ciências naturais já se dedicam à investigação sobre como é constituída as coisas da natureza e quais os princípios e leis governam os diversos fenômenos da realidade, o que restaria à filosofia, em especial à metafísica, investigar? Uma das orientações disponíveis foi proposta por Aristóteles: podemos dizer o que é o ser caracterizando-o segundo os conceitos mais gerais e abstratos possíveis. Na terminologia filosófica, esses conceitos mais abstratos e gerais são chamados de "categorias". A maneira intuitiva de se entender o que é uma categoria é tomá-la como um conceito tão abrangente e tão geral que se fôssemos usar um conceito ainda mais geral para classificar o objeto em consideração só restaria dizer que ele é uma coisa ou uma entidade. Tome-se o exemplo de Sócrates. Podemos classificá-lo dizendo que ele é um ser humano. Mas ele também pertence a classes ainda mais gerais. Sócrates também é um mamífero, um vertebrado, um organismo vivo. Segundo a proposta da metafísica, podemos avançar nessa classificação de Sócrates, passando por conceitos cada vez mais gerais até chegar a uma tão geral que, se déssemos mais um passo, só restaria classificá-lo como um ser (uma coisa, uma entidade). Na metafísica aristotélica, por exemplo, Sócrates e os demais seres humanos pertencem à categoria da substância. A tarefa da metafísica, portanto, seria a de identificar essas categorias básicas e generalíssimas, bem como revelar as suas inter-relações. O resultado dessa empreitada seria a revelação do próprio arcabouço da realidade – quer consideremos que esse arcabouço seja a própria estrutura do real, quer o entendamos como o esquema básico de nossos conceitos sobre o mundo.

Mas não se deve pensar que o trabalho dos metafísicos resuma-se a um procedimento monótono de fazer classificações cada vez mais gerais até chegar aos conceitos mais abstratos possíveis. As categorias não são coisas dadas que apenas aguardam passivamente que alguém as encontre. É certo que há, em maior ou menor grau, certo consenso sobre que tipos de conceitos valem a pena ser discutidos – justamente por representarem, aparentemente, elementos básicos ou fundamentais de nossa concepção de realidade. É o caso de noções como mente, corpo físico, objeto abstrato, valor, evento, processo, disposição, necessidade, estado de coisas, propriedade e fato. Na verdade, grande parte das discussões metafísicas giram em torno de quais dessas noções devem ser consideradas categorias – ou, em outras palavras, o que devemos tomar por mais fundamental e elementar na estrutura da realidade. Diante de uma lista de noções básicas como a apresentada duas tarefas se impõem: (1) determinar quais são as mais básicas; (2) mostrar como as categorias se relacionam com outros conceitos básicos. Tome-se, por exemplo, uma teoria metafísica que considere que os corpos físicos são mais fundamentais que as mentes. Uma das tarefas dessa teoria será conciliar os estados mentais com os corpos físicos, e responder questões como "A mente humana é o mesmo que estados e processos físicos?", "Como a mente emerge da matéria?", "O que há de errado com a ideia de separação entre o físico e o mental?". Outro exemplo. Alguns filósofos defenderam que as nossas percepções são ontologicamente mais fundamentais que os objetos materiais. Essa é uma tese que vai de encontro ao senso comum. Geralmente, tomamos os objetos físicos que nos cercam (pessoas, mobílias, casas, animais) como coisas existentes e independentes de nossa percepção. A tese metafísica de que as percepções são mais fundamentais terá, então, de ser desenvolvida em explicações sobre como esses objetos materiais são construídos e elaborados a partir de nossas percepções e sobre qual é o seu status ontológico já que são construções oriundas do sujeito.

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