FRANCIS BACON: POR UMA ÉTICA NATURALISTA MATERIALISTA


Há uma ética naturalista materialista subjacente ao pensamento baconiano, de par com um realismo político de inspiração maquiaveliana, sob a superfície dos livros mais conhecidos e de opúsculos menos divulgados.

Bacon e a ciência natural

Exigente com o futuro cientifico experimental, Bacon propôs a neutralidade cientifica como condição basilar de produção de produção da ciência moderna. Bacon precedeu a reflexão pelo acerto de contas teórico e pelas críticas à concepção aristotélica de ciência – e, no detalhe, à lógica e aos silogismos – como herança do aristotelismo escolástico. Reivindicava o conhecimento teórico deveria redundar em obras e que as forças da natureza, uma vez objetivadas, teriam como papel fundamental libertar o homem do trabalho que o embrutece, desde a maldição ontológica das primeiras páginas do Genesis, senão absolutamente, ao menos a ponto de facilitá-lo e abreviá-lo.
Crítico do imaginário medieval cerca da natureza, Bacon esclarecera no primeiro aforismo da obra, Novum Organum, como um cartão de visitas, o que pensara acerca da relação homem e natureza, como indicativo do incipiente empirismo em curso, e à contraluz da passagem bíblica supracitada.
Ao primeiro ídolo, a crítica recai sobre o antropomorfismo generalizado da comunidade humana, organizado por famílias, afinidades amistosas e grupos sociais. Os segundos idola são os da caverna, numa alusão à alegoria de Platão, constante do Livro Sétimo da República. Bacon revela-se fino conhecedor da lama humana, como herdeiro de Maquiavel e da linguagem de Pascal. Entende o homem atrelado às condições naturais e às circunstâncias sociais.

Por uma ética naturalista materialista

 Bacon, ao analisar alegoricamente os mitos gregos, indicara a interpretação correspondente a cada um deles, porém, passíveis de ser agrupados por temas. Dentre todos os mitos interpretados, acolhe-se o de Orfeu para exploração do perfil ético naturalista materialista, recontado em “Orfeu, ou Filosofia; pela medida de tensão trágica e com doses de lirismo. O duplo canto de Orfeu, um voltado para serenar os Manes, outros para embalar as feras e seduzir as selvas, aponta para o cumprimento dos fins da filosofia natural e da filosofia moral. O restaurar das coisas corruptíveis da natureza, como missão da filosofia natural, só pode se dar na medida em que se torna verossímil à harmonia musical expandida da lira pelas mãos de Orfeu”.
Ao primeiro grau de arte de dissimular e de esconder corresponde o movimentar-se como discrição, pois o discreto não permite revelar-se, de pronto. Tal como o entrar e sair de situações adversas sem deixar rastros, sem ser percebido. O segundo grau é a própria dissimulação, pois a dissimulação “segue muitas vezes por necessidade da discrição, de tal maneira que aquele que quer ser discreto tem de ser em certo grau um dissimulador”. Para o terceiro grau da arte d esconder e dissimular, não há como fugir da simulação e da falsa declaração, consideradas por Bacon como mais “culpadas e menos políticas, exceto, talvez, em grandes e raras ocasiões”.
Bacon conclui o ensaio acerca da simulação e da dissimulação, com habilidade moral, ao assegurar que o “melhor é compor e temperar para ter fama e reputação de fraqueza; ter por habito a discrição; dissimular moderadamente; usar do talento de simular quando não houve outro remédio”.

Se para Bacon “a verdade é filha do tempo e não da autoridade”, torna-se imperativo lê-la filosoficamente à luz do seu tempo.

FONTE: Sala de Aula

Comentários